Parada LGBT – Financiamento das grandes empresas e contradições
O interesse das grandes corporações por temas ligados à população LGBT revelam a urgência da unificação na luta de classes
A Parada LGBT de São Paulo reuniu mais de 3 milhões de pessoas no último dia 18 de junho, segundo os organizadores. O evento realizado desde 1997 na capital paulista foi registrado em 2006 no Guiness Book como a maior parada do mundo e neste ano foi palco da 21° edição com o tema “Independente de nossas crenças, nenhuma religião é lei. Todas e todos por um estado laico”.
Com certeza a imagem das maiores avenidas de São Paulo cheias de pessoas vestindo as cores do arco-íris, um dos símbolos da comunidade LGBT, chamam atenção de diversos setores da sociedade, desde os mais reacionários e conservadores que expelem seu ódio através das redes sociais, até os ditos progressistas. Naturalmente o crescimento da Parada LGBT e as bandeiras levantadas por essa comunidade também chamam atenção das grandes empresas e corporações. O grande interesse de grupos empresariais ficou mais evidente na edição desse ano da parada quando Monsanto, Pepsico, Ambev e grandes da tecnologia como Google e Microsoft, patrocinaram o evento e direcionaram um grande volume de marketing ao público LGBT.
Dois lados da mesma burguesia
Em diversos meios de comunicação tradicionais e alternativos e nas redes sociais, a participação das grandes empresas na parada LGBT foi exaustivamente elogiada. Seus produtos massivamente vendidos. A guinada dessas empresas para a causa LGBT foi majoritariamente entendida como uma boa mudança com rumo a um futuro mais inclusivo. Não analisar a fundo as razões para a composição desse cenário é um grande erro pois o que o sustenta está longe de ser bondade.
A cidade de São Paulo tem como prefeito, João Doria (PSDB), um genuíno marqueteiro político representante dos grandes empresários inimigos dos trabalhadores. Doria e seu partido anunciaram orgulhosamente a abertura de um edital de chamamento público em busca de patrocínio de empresas privadas para a realização da Parada LGBT da capital. O prefeito e seu grupo querem entregar o máximo da cidade de São Paulo para iniciativa privada e isso não poderia diferente já que o evento tornou-se lucrativo para o turismo da cidade.
O PSDB e suas tentativas de inclusão em temas relacionados a minorias tem tanta profundidade quanto uma camada de pó, é facilmente desmascarado pois o partido é historicamente ligado à repressão de lutas populares, de governos e mandatos contra os interesses da classe trabalhadora e de pautas progressistas. Além disso é também um dos maiores apoiadores da Reforma Trabalhista, da Previdência e do Ensino Médio. Uma das provas de que Doria e o PSDB pouco se importam com a população LGBT e com as minorias é que a extinção das secretarias de Mulheres, LGBT, Igualdade Racial e Juventude, foi uma de suas primeiras ações enquanto prefeito.
Entre as marcas e empresas presentes na Parada LGBT, uma delas chama atenção pela recente história de reconstrução publicitária. A Skol, uma das marcas do grupo Lemann, foi massacrada com críticas no carnaval de 2015 ao lançar uma campanha publicitária em que sugeria deixar o “não” em casa. Após a acusação de apologia ao estupro nas propagandas a Skol começou um processo de recuperação de imagem. Dois anos depois vemos a empresa tentando convencer grande parte do público presente na Parada LGBT que deixou todos os preconceitos para trás, tornando-se a maior patrocinadora do evento, apoiadora da causa LGBT com lançamento de produtos especialmente para esse público e propagandas repaginadas para vender o conceito da “diversidade”. É necessário explicar que a Skol faz parte das inúmeras marcas do grupo AB-Inbev cujo dono é Jorge Paulo Lemann, o brasileiro mais rico segundo a Forbes.
Lemann também é dono do fundo 3G Capital (dono do Burger King), da B2W (que reúne Lojas Americanas, Submarino) e da Kraft Heinz (Lacta, Royal, Tang, Trakinas e Trident, Heinz). Além de se interessar pelo controle de redes de alimentos e bebidas, Jorge Lemann também é um dos mais interessados na abertura da escola pública para a iniciativa privada e está entre um dos patrocinadores do “Escola sem Partido” através do Instituto Lemann. Como é possível que o mesmo grupo que apoia um projeto de escola sem discussão de gênero ou debates sobre tolerância e diversidade também esteja querendo fisgar o público LGBT com sua “publicidade inclusiva”?
O setor mais inteligente e pragmático da burguesia sabe que a melhor estratégia para os negócios é deixar de lado algumas ideias medievais e, dessa forma, ganhar a simpatia do público LGBT. Não só sua simpatia mas sua devoção e dinheiro ao comercializar o que muitos chamam de “representatividade” e “visibilidade”. Nada mais do que disfarçar a carcaça velha e podre com uma roupagem colorida.
Não devemos ter qualquer ilusão de que é possível confiar ou esperar uma mudança real desses setores. É preciso enxergar com clareza o fato de que a finalidade das empresas que adotam o apoio a causa LGBT é a pura propaganda para ampliar seu mercado consumidor. As empresas não se tornam mais humanas ou menos opressoras pois enquanto erguem bandeiras, seguem oprimindo trabalhadores e apoiando políticas de destruição de direitos democráticos.
O origem das marchas
O evento que deu origem a primeira parada LGBT foi marcado por uma luta corajosa contra a violência. Algo interessante e pouco exposto é que diversas pessoas não LGBT’s foram solidárias e se juntaram a resistência e protestos contra a repressão policial e por direitos iguais naquela ocasião.
As batidas, detenções e agressões a LGBT’s eram comuns nos estabelecimentos que acolhiam essa comunidade. A Revolta de Stonewall, como ficou conhecida, ocorreu no dia 28 de junho de 1969 em um bar de Nova York. Como de costume, policiais invadiram o estabelecimento e prenderam homossexuais, transexuais, drag queens e lésbicas presentes no bar. Nesse dia, as pessoas se recusaram a aceitar aquela violência e resistiram. Um tumulto começou e os policiais agressores acabaram encurralados dentro do bar enquanto do lado de fora os manifestantes jogavam garrafas, pedras, latas de lixo. Pessoas da comunidade ao redor se juntaram a manifestação e no final da noite somavam mais de 600 manifestantes.
Nos dias seguintes, Stonewall tornou-se um ponto de encontro de resistência e outros protestos foram realizados. Na época, lutas tais como a do movimento dos direitos civis dos negros e manifestações contra a guerra do Vietnã, também aconteciam no país. A solidariedade entre essas pessoas possibilitou que as primeiras marchas em defesa dos direitos iguais da população LGBT fossem realizadas.
Com o tempo e a influência do grande capital, o registro de luta foi sendo contornado por ideias mesquinhas de conquistas econômicas pessoais em detrimento das conquistas coletivas. Essa cultura que se internalizou no movimento LGBT causou uma divisão que vemos hoje com ainda mais evidência. São vendidos modelos de como ser gay e se encaixar na sociedade sendo bem sucedido no sistema capitalista. Muitas pessoas tentam se encaixar nesse pacote e as que não conseguem, a maioria, sofrem com as mesmas mazelas que todas trabalhadoras e trabalhadores.
As pessoas que frequentavam Stonewall eram marginalizadas por suas orientações sexuais e identidades de gênero mas também porque eram pobres, estavam em um lugar à margem da sociedade e não usufruíam da mesma blindagem que os LGBT’s da elite de Nova York.
Afastar as novas gerações do que aconteceu em Stonewall em 1969 é desconectá-la de todo sangue e suor vertido para que direitos mínimos fossem conquistados.
Os revolucionários sempre ao lado dos oprimidos
Acusações de que os marxistas não se preocupam com discriminações de raça, sexualidade e gênero, são comuns. Isso se deve a uma contínua campanha de difamação da história da classe operária e das próprias derrotas sociais que a contrarrevolução stalinista provocou. Na verdade, os marxistas estão ao lado dos oprimidos nessas lutas e devem ser os maiores opositores de qualquer tipo de discriminação. Lutamos por mudanças pontuais dentro do sistema capitalista mas sabendo que essas demoradas e pequenas mudanças não são o que queremos como resultado final, não queremos viver das migalhas que a burguesia nos dá, o objetivo é fortalecer e avançar a luta por uma nova sociedade em que todas as pessoas sejam genuinamente tratadas como iguais.
As opressões contra a população LGBT, contra mulheres e negros não acontecem de maneira isolada nem em termos individuais. A exploração e opressão de classe são sua origem de modo que a luta contra essas questões deve decorrer da luta contra a exploração de classe e não em várias frentes separadas como se cada minoria fosse um time tentando ganhar sozinho seu próprio jogo.
Entre as inúmeras lições que podemos aprender da Revolução Russa existe uma em especial que não deve ser esquecida pelos jovens revolucionários que estão incluídos na sigla LGBT: a revolução proletária garantiu a população LGBT o que nenhum país dito democrático jamais proporcionou. Lutamos por direitos que já eram lei em 1926 na URSS. Com a chegada dos bolcheviques no poder, todas as leis homofóbicas do período czarista foram colocadas abaixo e em seu lugar, a homossexualidade ficou de fora do novo código criminal e o casamento homoafetivo foi legalizado. As pessoas tinham plena liberdade para desenvolver suas habilidades, para tomar suas decisões pessoais sem medo.
Apenas lutando unificadamente, como classe, contra nossos opressores em comum, é possível conquistar a mais plena liberdade para todas as pessoas independente de sua cor, gênero, orientação sexual.